sábado, 11 de junho de 2016

PARADOXO

dê-se por satisfeito
se te enterrarem uma flecha no peito
que penetra fundo é dói
não por acaso em tudo há dois gumes
enquanto um cura, o outro destrói
e para quem não aguenta o intento
vem o suicídio, súbito ou lento
a perseguir a hipotética paz dos cemitérios
nunca se provou, nem mesmo a ciência
que no profundo sono da morte
cada ser [ateu, crente ou cético] leva escondido
um quê de profético e originário
que une a humanidade em um estúpido
e último desejo imaginário:
querer perpetuar a mesma incerteza
de sentir em tudo esses dois lados que rejeita,
mas pelos quais se sofre uma vida inteira...
e parte-se com a lembrança de querer voltar a ver
o sol raiar [mesmo que quadrado]
no dia do juízo final [que não há no calendário]

virginia finzetto

quinta-feira, 12 de maio de 2016

O SILÊNCIO DOS ANJOS

ele ou ela era assim. pairava. até a definição do gênero era difícil, porque queria ser neutro em tudo. desde pequeno na escola deixava de comer na cantina, porque fatalmente deveria pronunciar um nome e isso já era uma escolha. e ele ou ela não conseguia, estava além de seus princípios, julgava-se acima disso. síndrome de anjo, que difícil. deveria servir a quem? aos homens? mas e esse corpo? e essa alma? e esses desejos loucos? eu sou humano, ó dó! só haveria um jeito de resolver isso: morrer, já que havia nascido. nascido aqui, onde cada passo é uma escolha, um lado, um compromisso.

virginia finzetto