domingo, 9 de outubro de 2016

ANAMNESE

não gosto do morno
mas também não suporto o frio
sequer o muito quente
não passo roupa
e deixo a louça secar ao vento
que também balança a roupa no varal
e tudo fica com cheiro do sol
o queimado do leite derramado
sobre a grelha do fogão
acaricia meu olfato
mas limpar tudo, eu aprecio não
gosto do azedo, do salgado e pouco do amargo
mas doce, ah, o doce... do doce eu gosto muito
como gosto do V
mas amar mesmo eu amo o M
como amei o N, o D, o R, o C...
não sei as voltas que os mundos darão
e quantas vezes na roda dos signos
comi de cada um com amor e tesão
mas sei que giro e não faço contas
e mesmo assim você diz me conhecer?


virginia finzetto

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

LITERAL

Veja bem, marido, não é mais uma DR, esta é literária e literal. Nossa relação era um romance. Não fosse aquele seu enredo erótico, aventura que acabou em policial, eu poderia até relevar como sendo mais uma fantasia minha, outra obra de ficção. Mas logo vi que não era ensaio, pelo tempo que durou a novela. E foi seu papel de canastrão protagonista que jogou a coadjuvante aqui definitivamente de escanteio, e sem prêmio de consolação. Aguentei tanto chifre que minha vida virou uma fábula. De lá pra cá, tudo é teatro, e você pra mim é peça que não se encaixa mais em nenhum ato. Esta dor é crônica, e por mais que eu imagine falas, eu não conto, pois ao final de tanta prosa sobrou nenhuma poesia. Um terror. Você acabou com a nossa história e meu humor... Auto lá, sem mais suspense, chega de farsa! Vamupará com este faz gênero, com esta comédia e ir direto ao desfecho do que foi nossa tragédia.


virginia finzetto

domingo, 25 de setembro de 2016

EMBAIXO COMO EM CIMA


nessa boceta
há um triângulo
das bermudas
sumidouro
em que se afogam
paixões fantasmas
nas idas e vindas
do mar[ejar]
que brotam dos olhos

virginia finzetto

sábado, 10 de setembro de 2016

A DURAS PENAS


que jeito de amar

a vida lhe botou

não lhe faltam pares

a[penas] é

que atrai ímpares

que completam suas asas sem voo

triste sina essa vida de galinha

depois de tanto dar

ter que abdicar:

vai nessa que eu não vou!

[por que isso coube a mim,

não à ema ou ao pinguim?]






virginia finzetto

terça-feira, 6 de setembro de 2016

FÔLEGO


como solfejo
dentro de mim
em retiro
a grande borboleta
infla as asas
assim que te vejo
cada vez que respiro


virginia finzetto

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

[EU] LUTO

queimaram
minha pele
calaram
minha língua
durante anos
sufocaram
minha alma
achei que
havia me livrado
do respirador
artificial
mas vivi
meia vida
para voltarmos
à meia boca


virginia finzetto

terça-feira, 9 de agosto de 2016

SCRIPT

a verdade é que dentro de mim eu sou o que eu quiser e ninguém fica sabendo. mas também reúno personagens que às vezes me escapam. um deles luta eternamente pela união de todos os outros, enquanto aquele em especial me trai. quem olha diz que tá tudo bem, porque não deve ser muito diferente com ninguém. interessante é observar personagens com o mesmo script de amor ou de ódio andando por aí, se apaixonando ou brigando. 

virginia finzetto