era a leitura matinal do horóscopo
e ainda assim pulava partes,
fazia um resumão,
um apanhado geral,
estava mais interessado
na vida alheia
particularmente na sereia,
vigiada de longínqua praia
virginia finzetto
descendo umas escadinhas no interior da casa de pedra, havia uma cozinha com fogão à lenha e sobre ele as castanhas estalavam na chapa de ferro. lá fora o frio típico dos alpes italianos, lá dentro, a aquecida companhia da minha família, em Trento. logo um jantar com arroz de funghi e um bom vinho. memórias doces e mornas que me acompanham. quem disse que não há volta no tempo? sinto na pele e no ar o doce aroma do lar ancestral.
todos os dias aceito o convite da minha amiga imaginária e fico por muito tempo ali, em um lugar qualquer, e longe de qualquer olhar, a observar o mundo com ela. e não abrimos a boca, apenas nos olhamos e concordamos sobre tudo o que há para se ver e que não há um lugar específico em que não se possa ou se possa melhor enxergar. depois eu volto pra vida e fico sonhando em ir para esse lugar supostamente livre do olhar normal do mundo.
quando tenho insônia de madrugada, vou pra cozinha e fico observando as formiguinhas pra cá e pra lá, atrás de alguma coisa que não deixei na pia. então eu como um biscoito só pra cair farelos e eu poder dormir com a consciência tranquila.
ainda sobre o tema...
fui tirar a toalha do café da manhã, afastei o pote de açúcar e ela estava ali, aparentemente esmagada. toquei-a de leve e ela começou a se mexer lentamente, como que despertando. depois caminhou até a borda e conferiu com a patinha que dava pé para atingir a mesa. e assim foi, como se nenhum humano horroroso lhe oferecesse perigo. sacudido, voltei a colocar o pano no lugar. e lá veio ela de volta, tateando para subir de novo. acho que ainda estava com sono. faz o tipo que gosta de dormir na própria caminha. ah, virou minha pet, a formiga danadinha.
virginia finzetto