agora todos os animais
não se reproduzem porque
não exalam seus odores
não identificam nem sentem
certas frequências do som
da sintonia do amor
substituídas as câmaras de gás
inodoras do holocausto
suprimidos os bemóis
e retirados os sustenidos
humanos não se reconhecem mais
não se admiram nem se olham
sob os escombros do descartável
todos copulam como ordenhadeiras mecânicas
e ignoram seus bebês desprogramados
largados em depósitos
vigiados por babás eletrônicas
de última degeneração
nesse império da deformidade
não sentem perfumes nem sabores
não enxergam nem ouvem
não identificam o cheiro do enxofre
nem o podre da carne
exalados pelas chaminés de extermínio
esse imenso exército sem tato morre viciado
em inalar um tipo raro de tiol volátil
um desumano agente entorpecente da alma
que elimina sem qualquer reação
o limite acima da quantidade programada
pela descomuna mundial
apenas os rouxinóis resistem
fazendo seus ninhos no topo das montanhas
do lixo cibernético acumulado,
como minaretes a arranhar o céu
de toda a loucura,
e não se cansam de entoar seu chamado
à lembrança
quase perdida
do que um dia
já foi sagrado
virginia finzetto
[in revista literária Plural F451, edição de junho de 2019]
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