sábado, 27 de fevereiro de 2016

ESPIANDO A ALMA ALHEIA


Parecia ser um jantar informal. Uma conversa entre um homem e uma mulher. Fiquei observando, enquanto bebericava aguardando meu pedido, como ele a triturava com os olhos, enquanto suas mãos dobravam lentamente a toalha de papel fazendo um movimento de fole de sanfona em direção a ela. De onde eu estava não era possível ouvir a conversa. Como se eu estivesse vendo um filme de cinema mudo, comecei a legendar mentalmente a cena: [ela] tá bom, você quer ouvir mesmo a verdade? [ele] sim, foi pra isso que viemos aqui conversar. [ela] eu não transei com ele (silêncio profundo) ok, transei... mas não foi bom... (pausa rápida) tá, eu transei sim e foi ótimo! [ele] sua (primeira dobra) filha (segunda dobra) de (terceira dobra) uma (quarta dobra) grandessíssima (quinta dobra) ... (sexta dobra)... FIM (sétima dobra). Despertei com a voz do garçom perguntando "posso servi-la?", enquanto flagrava o tal casal unir as mãos sobre a mesa e tascar um longo beijo. Tsc, já não se faz mais realidade como antigamente, pensei. 

virginia finzetto

sábado, 20 de fevereiro de 2016

FINITUDE

não me dói tanto pensar que sou um nada diante do imenso universo de galáxias inofensivas. o que não consegue se aquietar no quadrilátero superior do meu tórax, mais precisamente no quadrante esquerdo, é essa insignificância de uma vida diante da impunidade do mal praticado pelo homem, que meus olhos se acostumaram a ver. se é maior o índice de suicídio nos países do primeiro mundo, onde os valores de consciência são mais elevados que a busca do lucro fácil, talvez eu preferisse viver lá, porque entre todos os "ídios", de homicídios a genocídios, que nesta encarnação minha alma encara penalizada, quem sabe tirar minha própria vida não fosse uma opção desonesta, a ter que me sujeitar a uma sina que não é de minha escolha; a sina da impotência frente à crueldade que só os sensíveis podem avaliar como a mais dolorosa desta finitude de vida. 

virginia finzetto