quarta-feira, 20 de outubro de 2021

LUTOS

tenho lembranças dos rituais da minha infância, do tempo em que os mortos eram velados em casa. recordo a dor da partida de um familiar ou de um vizinho e as lágrimas sinceras rolando nos rostos daquela gente querida em cada despedida que vivi. era uma época de compartilhar as alegrias, em conversas de portão e na calçada, e as tristezas, em volta de um caixão na sala, com a mesma presença desse espírito solidário. sei que, mais tarde, viciei em ler os obituários nos jornais imaginando como seria a vida, os sonhos e a causa da morte daqueles desconhecidos. e, a cada um se perguntando "por quê, eu?", minha despedida silenciosa "não se preocupe, vá em paz! agora, isso não importa mais", numa tentativa de dignificar cada ser humano como indivíduo neste mundo. cheguei até aqui para ver, agora, esse desencarne em baciada neste clima de "mal enterra um já morre outro", de milhares de desconhecidos protagonizando um luto em massa, em uma absurda estatística aferida e desejada por uma gente sem amor. peço perdão se hoje me falta ânimo e tempo necessários para manter meu ritual diário e particular, mas penso que se chegamos nessa banalização da morte é porque precisamos com urgência ressignificar a vida para nos devolver nossa defunta humanidade.

virginia finzetto

segunda-feira, 27 de setembro de 2021

MERCÚRIO

se eu tropeço com as letras
e ralo a boca nas palavras
é Mercúrio que bate e sopra
remédio que 'arte' e cura

virginia finzetto

domingo, 19 de setembro de 2021

POETAS

tem poetas
músicos do ego
que falam de si
músicos da alma
que falam de dó
músicos da natureza
que falam de sol
músicos do mundo
que falam de lá
músicos da justiça
que falam de ré

tem poetas de todas as sílabas
em versos musicais
eu apenas invento repentes
versos que desafiam letras
a desafinar rimas

virginia finzetto

sábado, 4 de setembro de 2021

PRESSA E URGÊNCIA

correr, sem sair do lugar, é pressa. o que eu tenho é urgência. eu acaricio cada segundo como se ele fosse o primogênito, único, singular, revelando a mim seu instante efêmero sem nenhum apego ou vaidade. e com ele eu aprendo a ordem das importâncias e a equivalência das coisas que dialogam. e no segundo segundo já é novidade, enquanto eu vou acrescentando tudo como recheio ou cobertura, enfeitando de reminiscências as horas, os dias, os meses, os anos, as décadas. quiçá chegarei ao século. um bolo e tanto.


virginia finzetto

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

CONTAS A PAGAR

tento conciliar o dia
entre o que quero
e o que posso fazer,
mas a conta não fecha:
faltam horas,
não me sobram forças.
aritmética simples de
uma avançada vida.

virginia finzetto

terça-feira, 3 de agosto de 2021

AS OITO MARIAS

Meu conto foi incluído no projeto Relatos de Mulheres, idealizado pela Inominável Companhia de Teatro, com recursos do mecenato cultural da Prefeitura de Curitiba. As narrativas trazem sempre como figura principal histórias de personagens femininas.

Leitora: Lilyan de Souza
Texto: Virginia Finzetto
AS OITO MARIAS