eu tenho um caderno repleto de poemas invisíveis. em cada folha, vejo um lápis hesitante e um verso abortado. códigos dos anjos votivos da boca calada. dizem eles que meu silêncio é o fermento necessário para o florescer das ideias luminosas. sem nenhuma previsão, descrevo saudades antigas, como essa que trago dos Beatles quando mataram Paul McCartney e eu acreditei. depois assassinaram o Lennon de verdade, Imagine! George, arre!Sun mil também. agora, só Ringo Starr.
quinta-feira, 23 de novembro de 2017
domingo, 19 de novembro de 2017
APREÇO
apreciar, ato raro. não sinto em nenhum de seus sinônimos a poesia cadenciada que exala desse verbo que rebola bola sensualmente. não se trata de botar reparo, muito menos de manifestar arroubos. na mesma calçada, de mãos dadas, andam juntas paz e serenidade. apreciar é a musa do ócio criativo, seu caso de amor mais antigo. do contrário seria apenas leitura dinâmica, passar de olhos. apreciar é agarrar com as mãos ávidas uma grande foda sem hora marcada, penetrando todos os poros do deleite.
virginia finzetto
sexta-feira, 10 de novembro de 2017
IN EXTREMIS, IN AETERNUM *
Às vezes me pego esperando por algo que precisa acontecer para que outro acontecimento aconteça. É como se houvesse a necessidade tácita de um antes nos bastidores dos atos. Uma antecâmara de cada cena manipulando-as como marionetes para a plateia sempre adormecida.
Seguir o ritmo de um marcador de tempo, como no compasso de um marca-passo, no número de giros da corda mecânica da caixinha de música, no intervalo de cada clique do interruptor de luz… Nos instantes em que estamos ausentes, onde estamos?
Seria esse gap proposital para que o ser desperto se dê conta do significado da pura espontaneidade? Esta que é a naturalmente responsável pela condução da vida de toda a criação que não a humanidade.
No momento em que o avião inicia sua decolagem, não resta outra opção além da minha entrega para que vingue o voo. Para o curso planejado não pode haver dúvidas. Qualquer vacilo, gagueira, espirro pode virar o fracasso do espetáculo.
“— Pode-se continuar morrendo pela eternidade…”
Pode-se continuar vivendo na vacuidade.
Pode-se perpetuar alheio a cada golfada de ar a preencher os pulmões.
Pode-se fingir atenção em cada distração.
Pode-se permanecer disperso em qualquer concentração.
Preso a algum ponto da esfera, percebe-se singularmente esse intervalo feito de números, calendários, metas, morais, regras, crenças convencido de que se pertence a algum diâmetro ou raio em particular.
Viver é um verbo que só pode ter sido inventado por algum prestidigitador, nome difícil até de pronunciar. Morre-se desde que se nasce, perpetuamente. Só.
virginia finzetto
* Nos últimos momentos da vida, eternamente.
publicado na COLUNA PLURAL (scenariumplural.wordpress.com) em 9/11/2017
domingo, 5 de novembro de 2017
BISCATE
no meu ramo
há negócios
frutíferos
faço cílios
postiços
de papel crepom
para faróis de carro
enfeito a vida
e ganho o pão
com quebra-galhos
há negócios
frutíferos
faço cílios
postiços
de papel crepom
para faróis de carro
enfeito a vida
e ganho o pão
com quebra-galhos
virginia finzetto
sexta-feira, 3 de novembro de 2017
VEREDAS
aos poucos, a inspiração vai abrindo uma vereda no matagal do esquecimento. adiante, há um princípio de incêndio, ateado pela ignorância, que não se deve debelar com lágrimas. ingenuidade concluir que tudo possa ser eliminado com lisuras. a passos firmes aproxima-se do alvo para pisar com firmeza no núcleo dessa rebelião preguiçosa. o que poderia fazer o capitão umbigo contra o general de todos os poros? acaba de ser cooptado.
virginia finzetto
terça-feira, 31 de outubro de 2017
A REFORMA DO ANO
de janeiro a fevereiro
abriu vaga no puteiro
em março
perdeu o cabaço
em abril
farejou o covil
abriu as pernas
maio junho julho
abriu mão da carteira
de trabalho
em agosto
assumiu o posto
promovido
a capitão do mato
setembro outubro
novembro dezembro
amputou cada membro
no réveillon
matou seu cérebro
virginia finzetto
poema sujeito a reformas...
abriu vaga no puteiro
em março
perdeu o cabaço
em abril
farejou o covil
abriu as pernas
maio junho julho
abriu mão da carteira
de trabalho
em agosto
assumiu o posto
promovido
a capitão do mato
setembro outubro
novembro dezembro
amputou cada membro
no réveillon
matou seu cérebro
virginia finzetto
poema sujeito a reformas...
sexta-feira, 27 de outubro de 2017
TÓXICO
rastros que vi no céu
não são de
incontinência de anjo
nem de pó de
pirlimpimpim,
aceno de pomba da paz
ou de avião
supersônico
eles hipnotizam
humanos
que seguem para o
matadouro
é rebanho infectado
toca gado... tô
cagado!
virginia finzetto
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