sábado, 13 de junho de 2020

SINESTESIA

no balcão da cafeteria, todos os dias, ela ficava ali por horas. os baristas olhavam-na com a impaciência do "vai querer o quê, dona?", as baristas, mais simpáticas, do "já fez o seu pedido?" . ela dava sempre a mesma resposta: "nada". assim que a porta da entrada se abria, todos se entreolhavam em risinhos de deboches do "lá vem a louca". quando a fofoca ganhou os ouvidos da gerência, veio a resposta que "a moça sempre deixa dez pagos". nos dias em que sua ausência era notada, eles não eram os mesmos. tropeçavam entre si, sem assunto, servindo aos afobados que se apinhavam disputando o seu primeiro. semanas, meses, e nada. acabaram se esquecendo dela, que apreciava apenas o aroma do café. souberam que ela ficara satisfeita com a experiência e que agora frequentava os pontos de fabricação e torra, insistindo para que a deixassem tocar nos grãos e no pó. 

virginia finzetto

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